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Entrevista: Programa Despoluir completa 15 anos

17/08/2022

À Revista Abrati, o diretor executivo da CNT Bruno Batista fala sobre os resultados e metas do Programa e a busca pela redução dos impactos advindos da atividade transportadora, por meio da regularização da frota e ações de educação ambiental.


Foto: Bruno Batista, diretor executivo da CNT (divulgação/Revista Abrati)

Programa Despoluir completa 15 anos. Criado em 2007 como uma iniciativa da Confederação Nacional do Transporte (CNT), em parceria com o Sest Senat, o Despoluir é considerado o maior programa ambiental do transporte da iniciativa privada no Brasil. Nesta entrevista, o Diretor Executivo da Confederação, Bruno Batista, fala sobre os resultados e metas do programa, do trabalho das transportadoras em busca da redução dos impactos advindos da sua atividade, como a regularização da frota nacional, e as ações de educação ambiental para o engajamento dos colaboradores das empresas do setor.

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Revista Abrati​ | Como o senhor avalia o avanço da consciência ambiental no setor de transportes nos últimos anos e qual a importância do Programa Despoluir nesse processo?

Bruno Batista | A responsabilidade ambiental tem se desenvolvido exponencialmente na atividade transportadora pela consciência ambiental, pela evolução da legislação, pelas exigências dos embarcadores ou pelas oportunidades de negócio. Um exemplo concreto é o Despoluir. O programa promove a evolução da excelência ambiental na rotina do transportador através de serviços gratuitos e inovadores, como a elaboração de materiais informativos e educativos; a análise de dados estratégicos como painéis ambientais; e a realização de serviços customizados, como a Avaliação Veicular Ambiental, da qualidade do diesel e de gestão ambiental. Além disso, participa de diversos fóruns nacionais e internacionais colaborando para o desenvolvimento de políticas públicas relacionadas ao tema e favorecendo o reconhecimento empresarial por meio de premiações, como o “Prêmio CNT de Jornalismo”, que possui uma categoria especial denominada Meio Ambiente e Transporte.

RA | Das diversas ações promovidas pelo Programa, existe alguma que o senhor considera de maior destaque para os resultados positivos alcançados?

BB | No dia 18 de julho de 2022, o Despoluir completará 15 anos comemorando importantes resultados da sua parceria com transportadores de todo o Brasil. A principal ação do Programa é a Avaliação Veicular Ambiental. Nesse serviço, já foram realizadas mais de 3,6 milhões de aferições em veículos a diesel de 55 mil transportadores. As aferições são periódicas e essa assiduidade possibilita a manutenção preventiva e corretiva da frota nacional movida a diesel, levando a mais economia com combustível, maior durabilidade de peças mecânicas e melhoria da eficiência energética – reduzindo, assim, a emissão de poluentes atmosféricos e preservando a qualidade do ar. É importante dizer que a avaliação visa a melhoria da qualidade do ar por meio da regularização ambiental da frota de veículos a diesel utilizada pelos transportadores, sobretudo, em áreas urbanas. Dessa forma, o Programa busca mitigar a poluição atmosférica, como o material particulado (MP), conforme recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).



"O capital mais valioso para nós é o humano. Somente quando investimos na formação de pessoas é que se alcançam os melhores resultados pretendidos nas políticas sustentáveis das empresas de transporte. A formação ambiental dos colaboradores propicia o uso racional dos recursos naturais, evita desperdícios, assegura a eficiência energética e a adequada gestão de resíduos e a descarbonização."

RA | Um dos pilares do Despoluir é a educação ambiental para os trabalhadores do transporte. Além da sociedade ganhar cidadãos mais conscientes, como esse olhar para as pessoas ajuda as empresas a desenvolverem melhor suas políticas sustentáveis?

BB | O capital mais valioso para nós é o humano. Somente quando investimos na formação de pessoas é que se alcançam os melhores resultados pretendidos nas políticas sustentáveis das empresas de transporte. A formação ambiental dos colaboradores propicia o uso racional dos recursos naturais, evita desperdícios, assegura a eficiência energética e a adequada gestão de resíduos e a descarbonização. Como exemplos, temos os seminários técnicos e encontros presenciais regionais para as 24 Federações associadas ao Programa. Também temos cursos de certificação nacional, como a série Amigos do Meio Ambiente, e internacional, fruto da parceria com o governo do Canadá para o Programa Fleet Smart. Nos últimos anos, o índice de aprovação da frota atendida pelo Despoluir tem aumentado. Outra comprovação é que os transportadores têm buscado o Despoluir para obter novos serviços ambientais, demonstrando, assim, o seu forte compromisso em aprimorar e inovar a sua atividade no que tange à responsabilidade para com o meio ambiente.

RA | Como foi, no início, organizar um programa ambiental de nível nacional em um País com as dimensões do Brasil e com centenas de empresas de transporte espalhadas pelo território? Quais foram os grandes desafios?

BB | As dimensões continentais do Brasil trouxeram o grande desafio de garantir a capilaridade de abrangência do Despoluir. Essa barreira foi superada, pois o Sistema CNT está presente em todos os estados brasileiros e disponível para atender as demandas ambientais do setor. Hoje, são 24 Federações atuantes, realizando atendimentos de serviços ambientais em todos os Estados. A estrutura do Programa é robusta e conta com 108 técnicos capacitados e certificados para atuar na regularização da frota nacional e na excelência ambiental da atividade transportadora. Outro desafio superado foi conquistar as empresas de transporte para participar do Despoluir de forma voluntária, permitindo a inspeção veicular ambiental do Programa em seus veículos. O Despoluir tem atuado junto às empresas por meio do incentivo, mostrando-se parceiro do setor, ao contrário da imposição fiscalizatória. Essa medida proporcionou um despertar para a agenda ambiental de maneira positiva, que tem estimulado diferentes municípios a aderir à proposta do Programa e expandir a aferição de suas frotas.


"O Despoluir tem atuado junto às empresas por meio do incentivo, mostrando-se parceiro do setor, ao contrário da imposição fiscalizatória. Essa medida proporcionou um despertar para a agenda ambiental de maneira positiva, que tem estimulado diferentes municípios a aderir à proposta do Programa e expandir a aferição de suas frotas."

RA | Olhando para o futuro, como o Despoluir vem auxiliando o setor no processo, cada vez mais urgente, de transformar para energia limpa a matriz energética da sua operação?

BB | Os problemas ambientais requerem a atuação de todos. O apelo mundial de combate à poluição está presente nas principais discussões mundiais e nacionais, como, no âmbito internacional, o Acordo de Paris e a Conferência das Partes (COP). O Brasil integra o Fundo Nacional de Mudança do Clima e o Conselho Nacional do Meio Ambiente, com a atuação da CNT nos principais fóruns. O transportador brasileiro pode contribuir muito com o alcance dos compromissos assumidos no Acordo de Paris, na utilização de energia limpa voltada à descarbonização e na adoção de novas alternativas, como os veículos movidos a biometano, a eletricidade, a hidrogênio, a diesel verde e demais fontes renováveis. A Confederação Nacional do Transporte publicou, recentemente, as obras técnicas "Biometano – Uma Alternativa Limpa para o Modal Rodoviário" e "Eletromobilidade – Uma das Soluções para Alcançar a Neutralidade de Carbono", que têm o objetivo de disseminar conhecimento sobre práticas que levem à descarbonização do transporte ratificadas no Acordo de Paris e na COP26.

"As empresas de transporte que não adotam boas práticas ambientais podem ser multadas e deixam de obter vantagens financeiras junto a, por exemplo, bancos de desenvolvimento, além de correrem o risco de perder clientes. Quanto mais responsabilidade ambiental houver, mais lucratividade a empresa terá. A adequação ambiental será a regra do futuro."

RA | Temos visto, seja no ambiente público ou privado, a exigência de eficiência ambiental das empresas que participam de processos de licitação e contratação de serviços. Diante de fatos como esse, podemos dizer que as empresas de transporte que não adotarem políticas ambientais efetivas, como sugere o Programa Despoluir, terão dificuldades em se manter no mercado?

BB | A eficiência ambiental eleva a visibilidade e a participação no mercado das empresas de transporte. Aqueles que investem na responsabilidade ambiental têm à mão um diferencial competitivo valioso e fundamental para a continuidade do negócio, ganhando visibilidade e vantagens em processos de licitação e obtenção de financiamentos e créditos subsidiários, por exemplo. A adoção de políticas ambientais efetivas é fundamental. Nesses 15 anos do Despoluir, sabemos que transportadores certificados pelo Programa são bem aceitos por operadores logísticos, embarcadores e zonas portuárias. As empresas de transporte que não adotam boas práticas ambientais podem ser multadas e deixam de obter vantagens financeiras junto a, por exemplo, bancos de desenvolvimento, além de correrem o risco de perder clientes. Quanto mais responsabilidade ambiental houver, mais lucratividade a empresa terá. A adequação ambiental será a regra do futuro. 

RA | Ao longo dos últimos anos, percebemos uma agenda mais forte de debate sobre o uso de energias não poluentes pelo setor. A indústria sempre traz novidades sobre o assunto, mas, na prática, a sociedade ainda não consegue perceber isso no seu dia a dia, o que dá a sensação de ser algo muito distante. 

Quais são os gargalos para que o setor de transportes troque, definitivamente, os combustíveis fósseis por energias renováveis?

BB | O principal desafio é o alto custo de aquisição de novas tecnologias. Muitas vezes, recursos financeiros próprios para a renovação de frota por veículos com tecnologias mais limpas não são suficientes. Apresentam-se como barreiras a demanda de alto capital para a renovação de frota e a exigência de infraestrutura complexa para constituição de pontos de abastecimento, seja para o desenvolvimento de eletromobilidade, seja para permitir a evolução do consumo de demais fontes renováveis, como o biometano, por exemplo. Para o alcance desejável da descarbonização pretendida pelo setor de transportes, o apoio governamental é muito importante e pode ocorrer por meio de incentivos traduzidos em políticas públicas – como regulações mais restritivas para tecnologias defasadas e poluentes. Neste contexto, também são importantes os programas de crédito mediante o sucateamento de veículos antigos. A China - País com maior número de elétricos pesados do mundo, por exemplo, incentiva seus transportadores a adquirirem essa tecnologia exigindo que os seus veículos antigos sejam sucateados. Com isso, os transportadores recebem incentivos monetários para realizar a renovação de frota.




RA | Após esses 15 anos de história, quais os próximos passos do Despoluir?

BB | Ainda vivemos num mundo que busca alternativas sustentáveis. O transporte, como atividade fundamental, assume sua responsabilidade no desenvolvimento da economia brasileira, da qualidade de vida de todos e da conservação do meio ambiente. O trabalhador do setor é ator fundamental nesse desenvolvimento, por ser um disseminador de boas práticas socioambientais. Por isso, o Despoluir continuará a estimular um modelo sustentável de crescimento, orientando sobre temas relevantes, como a redução das emissões de poluentes, a gestão e a educação ambientais e o uso racional de recursos naturais. O Despoluir evoluirá no sentido de desenvolver novos serviços e produtos técnicos voltados à eficiência, inovação e sustentabilidade nos diversos modais de transporte do Brasil.

RA | Fique à vontade para suas considerações finais.

BB | É sempre uma satisfação tratar do desenvolvimento ambiental do setor tendo o Despoluir como exemplo concreto de atuação. O Programa é, hoje, a maior iniciativa privada dedicada ao desenvolvimento sustentável do transporte brasileiro e recebe todo o apoio do Sistema CNT, que tem na pessoa de nosso presidente, Vander Costa, um grande apoiador e entusiasta. Agradecemos a Abrati pela oportunidade e aproveitamos para convidar todos a conhecerem mais o Despoluir, no site despoluir.org.br, mas o convite especial é ao transportador brasileiro: faça parte do Programa. Contate a Federação mais próxima da sua região. O Despoluir também conta com canal de comunicação via telefone, que é o 0800 728 2891 ou por meio do e-mail despoluir@cnt.org.br.


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A Abrati é a Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros

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Bruno Batista é engenheiro, bacharel em Direito e mestre em Transportes. Diretor Executivo da CNT, é responsável pelo  planejamento e execução de mais de 450 pesquisas, estudos e projetos técnicos, econômicos e ambientais de âmbito nacional na CNT desde 2001.